Techquity pode melhorar a cidadania e a confiança na America Latina ?

Uma pesquisa encomedada anualmente pela The Economist desde de 1995 realizada pela Latinobarómetro cita alguns números sobre os latinos-americanos, tais eles como os índices de aprovação do governo através dos 17 países incluídos no estudo que caiu de 60% em 2009 para 47% hoje, a polarização da população entre “direita” e “esquerda” esta aumentado, ou seja as pessoas já não se dizem “centristas”, estas pessoas eram 42% em 2008 e agora são 33%.

democracia
Thiago Rondon
Consultor em tecnologias cívicas
18.5.2023
Crédito: https://www.flickr.com/photos/dogtrax/18966701503/in/photolist-uU2iyT-uU2yRM
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Estamos confiando menos no estado de uma maneira geral, e um número sempre preocupante nos relatórios anuais e acredito ser o reflexo em diversos outros temas, que apenas 16% das pessoas na região concordam que “você pode confiar na maioria das pessoas”. Este número sempre foi baixo.

Há quase um mês atrás participei de um painel sobre empreendedorismo social na condatos no Chile, e quando vi estes números lembrei no mesmo momento de uma das frases ditas nele, como podemos confiar em alguém que quer ganhar dinheiro e fazer algum impacto social ? Ao mesmo tempo, foi apresentado o modelo canvas para o desenvolvimento de ações sociais e muito pouco focado em ser um produto ou serviço. Acredito, que na America Latina exista no máximo 5 financiadores para este contexto, ou seja, para piorar nossas discussões de empreendedorismo o foco de recursos é baseado em financiadores específicos. Estamos nos limitando.

Estou agora, no Code For America Summit na California. A primeira apresentação foi da prefeita de Oakland, Libby Schaaf, que chegou dizendo “vamos admitir, o governo nem sempre trata as pessoas igualmente” e tem promovido o termo techquity para descrever tecnologias que trazem equidade a todos os cidadãos, e principalmente prestar serviços municipais para aqueles que mais precisam. Ou seja, de uma maneira objetiva não é criar portais sofisticados de serviços públicos que vamos estar fazendo algo realmente valioso, mas é permitir que os serviços públicos chegam para as pessoas que realmente necessitam através de tecnologia, que atualmente não é possível. A mensagem foi no sentido de não utilizar a tecnologia para dividir, mas para ser uma ponte para os mais vulneráveis.

A relação com empresas exigem atenção. Recentemente, ela enviou uma carta para o Uber, que esta se mudando para Oakland, alertando para que eles se comportem bem, e tratarem bem seus cidadãos.

Uber é criticado por diversas ações que eles realizam com os dados de clientes, como por exemplo uma analise dos dados de usuário para descobrir prováveis sexos casuais, e quando foram acusados de sexismo um dos seus executivos ameaçou vazar informações embaraçosas de uma jornalista que fez as acusações. Além das polêmicas de modo de contratação dos motoristas no mundo todo. A proposta disruptiva do Uber é fantástica e esta colocando em discussão o monopólio artificial do setor que bloqueia a inovação e a melhoria de serviços por consequência, mas as críticas geralmente se devem ao comportamento de seus executivos e o modelo de contração.

Ela explicou o projeto da prefeitura com relação ao orçamento da cidade, que esta sendo mantido com visualizações simples para o cidadão interagir com ele, além de que todos os dados estão disponíveis para empresas e terceiros que queiram trabalhar com estes dados para melhorar e sugerir alterações no planejamento.

Também tivemos um painel com Brian Chesky, CEO do AirBnb e o Tim O’Reilly sobre qual o impacto do AirBnb nas cidades. Eles tem sofrido diversas críticas por conta do impacto financeiro, como o aumento dos valores de aluguel e diminuição no recolhimento de impostos pelos turistas, no qual ainda não há legislação definida. Brian, comentou que o AirBnb permite que qualquer pessoa possa ser um novo empreendedor com alguns cliques, compartilhando seu espaço de casa, porém fez uma ressalva que eles não são perfeitos em tudo, e que falharam em ter permitido que pessoas estejam comprando imóveis apenas para alugar via AirBnb, e é algo que eles estão trabalhando para melhorar.

(Um fato curioso, estou hospedado através do AirBnb neste momento, e é interessante que os vizinhos em conjunto constuiram um quintal em comum, isto mesmo, é divido entre os vizinhos a mesma área, por consequência da receita obtida pelo AirBnb.)

Diversas apresentações baseado na questão de saúde, e como as cidades estão trabalhando junto com empresas para poder melhorar o acesso das pessoas. Muito foi criticado sobre o modo tradicional de governos operarem e dialogarem, baseado na necessidade de criação de políticas, aguardarem a implementação e esperarem um impacto, em muitas apresentações sempre foi discutido como criar o ecosistema para permitir entregas constantes e interações com empresas que querem desenvolver serviços em cima destes dados. Para isto, um dos papeis do governo é oferecer API para seus serviços, capacitar agentes públicos e trabalhar com estratégias de um governo aberto inclusivo.

Outra apresentação muito interessante foi do Rob Bouganim sobre o Gov Tech Fund, mostrando como eles estão investindo em startups para melhoria do governo.

Nos Estados Unidos, 39.3% das pessoas acreditam que podem confiar na maioria das pessoas.

Isto leva a uma outra questão que resolvi explorar com eles, se há preocupação em terem suas soluções em software livre pelo motivo desconfiança. Conversei sobre este tópico com algumas startups aqui, e sempre que comentava dos motivos de acreditar que toda solução cívica deve ser software livre, lembrava do caso da Volkswagen. Uma delas, inclusive se sentiu ofendido, e na mesma hora eu disse “Sou latino! Não confiamos em ninguém!”. Mas o que eu realmente queria saber, se isto era uma vantagem competitiva com licitações ou contratações diretas. Não é.

De maneira resumida, eles só consideram software livre se for interessante para o modelo de negócio. Ou seja, o nível de confiança deles também permitem não discutir tanto sobre software proprietário ? Não acredito nisto, pois estamos com urnas eletrônicas a tanto tempo, que me parece que só uma parcela pequena das pessoas se incomoda, isto pode ser um ponto irrelevante lá e aqui, e talvez seja mais uma questão de legislação para ser debatida. Isto deve ser uma discussão com governos e não com as empresas, e é compreensível que seja assim.

Semana passada estive em um evento no Brasil, a Web.BR, moderando um painel sobre cidadania na Web. Estávamos discutindo sobre ações existentes, uma das participantes era a Fernanda Campagnucci que trabalha na Controladoria Geral do Munícipio de São Paulo, no qual viabilizaram ações fantásticas como abertura do diário oficial, disponibilizarão contratos da prefeitura, e o mais importante que é ter disposição para dialogar com a população através do Café Hacker, entre outras ações. Temos o caso da SPtrans que abriu seus dados e já foram desenvolvidas alguns aplicativos por terceiros, mas que eu tenha conhecimento nenhuma dela construiu um ecosistema para melhoria do serviço, nenhuma participação de empresa também foi impactada.

Mas como no evento no Chile, que reunia interessados no assunto na América Latina, ainda é um dialogo apenas entre sociedade civil organizada, ativistas e agentes públicos, e há muita desconfiança sobre as empresas.

Cadê as empresas ?

No Brasil, aproveitamos muito mal o contexto de inovação e startups no governo, existiram algumas iniciativas como a Startup Brasil, que não tinha como foco melhoria da cidadania e nem do governo, era simplesmente promover "empreendedorismo". Porém, o que o governo sabe o que é uma startup ? Se tiver mais interesse nessa pergunta, leia este artigo do Steve Blank.

Colocar dinheiro em uma startup, com uma probabilidade enorme de fracasso, como qualquer empresa. Enfim, até o momento todos os programas que vi, só rasgaram nosso dinheiro e qual foi o impacto ? Qual foi o resultado esperado nestes programas, além de marketing político ? Nenhum destes programas era focado em melhoria de processos dentro do governo, podia ser qualquer coisa, inclusive vender bala pela Internet!

O problema não é financeiro, não é questão de oferecer investimento para startups, o governo é um organizamo gigantesco que necessita de inovação e redução de custos em todos setores de maneira constante. Este ecossistema é fantástico e deve ser aberto para que empresas possam melhorar, principalmente as empresas pequenas e médias.

Comemorar que o Brasil lidera o ranking de transparência não vai mudar em nada nossa relação de cidadão com o governo.

Precisamos que agentes de governo criem facilitadores para o desenvolvimento de participação da sociedade, academia e empresas de maneira inteligente nos serviços públicos, principalmente para os excluídos. Atendendo eles, vamos ter uma cobertura maior e um impacto de como visualizamos o governo.

Atualizando: Interessante o programa de startups do governo de São Paulo, vamos acompanhar. http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/lenoticia2.php?id=242507

Gostei muito da recomendação da prefeita de Oakland, vamos trabalhar para Techquity, vamos trabalhar para os excluídos de cidadania, quem sabe nossa confiança possa melhorar ?

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